Oi Castelo,
Respondo primeiro esta mensagem, mais concreta, para que ajude a deixar
mais claras minhas opiniões, pois na sua outra parece-me haver uma
confusão sobre elas.
PS: esta resposta ficou tão longa e completa que acho que o que quer que
tenha sido mal entendido lá deve estar esclarecido ao final aqui,
portanto não há necessidade de responder aquela, ok - ufa! :)
On 03/15/2011 06:49 AM, CasteloBranco wrote:
Em 15/03/2011 03:52, Alexandre Hannud Abdo escreveu:
Então fica a pergunta, você tem alguma
experiência concreta de
dificuldade de colaboração institucional para compartilhar e pensarmos
juntos? Será que realmente é necessário um capítulo? Será que ao
contornar essa necessidade não acabamos por envolver mais parceiros a
multiplicar a influência dos mutirões?
Sim, algumas.
Ótimo! A ideia sempre foi criar soluções em função de resolver
problemas, sem partir atrás de fórmulas genéricas.
Diante dos exemplos a seguir, a questão a pensar-se é: será que uma
instituição única, dotada de uso nacionalmente exclusivo da marca
Wikimedia e uma série de outros privilégios é necessária ou produtiva
para responder a essas dificuldades? Será que ela é a melhor forma de
germinar e organizar mobilizações de extensão aos projetos on-line?
Desde o início a proposta dos mutirões nunca excluiu instituições, mas
propôs pensar também tratamentos diferentes dessas, que não colocassem
um pequeno grupo delas de forma tão central no movimento.
As mensagens onde menciono "desenho institucional", que o Névio achou
curiosas, tinham o sentido de apontar o quanto hoje eu enxergo o modelo
de chapters regionais exclusivos, quando fatorados os custos de
oportunidade, enfraquecendo o movimento Wikimedia em lugares com certas
características, dos quais o Brasil é um bom exemplo.
Recentemente, ajudei a promover uma ação relâmpago de
incentivo à edição
na Wikipédia em Esperanto. Convidamos pessoas pelo twitter, listas, etc.
para editar em 2 artigos, no dia do aniversário da Wikipédia. Como
prêmio, enviei dois livros, obtidos por doação de uma associação local.
A ação deu certinho, porque foi curta, de um único dia. Comecei a pensar
em ações maiores. E se fizéssemos por um mês inteiro? Uma organização
eslovaca fez isso recentemente com os 1000 artigos essenciais no mês de
aniversário da WIkipédia esperantista e naquele mês, fomos a Wikipédia
que mais cresceu. Ela distribuiu prêmios para 25 pessoas (recebi um
DVD). Se fôssemos replicar a experiência, não teríamos recursos. Não
posso acabar com o acervo deles distribuindo em brindes. Vários
associados manifestaram que gostariam de participar por doações,
perguntaram-me o número da conta, mas pegava muito mal uma ONG fazer
tais doações para... um voluntário da Vikipedio. A ONG não pode fazer
ela mesma a doação por respeito aos seus próprios sócios. Não é objetivo
dela (digo como organização, no Estatuto) promover a Wikipedia. Teria
que justificar para o Conselho Fiscal o uso de sua conta para
finalidades alheias, e registrar no Diário, Razão, Balancete, DRE... A
ideia ficou em stand-by.
Não entendi muito bem, aparenta que você começa falando de uma ONG
eslovaca mas depois diz respeito a uma ONG brasileira. Vou supor que
sim, mas a resposta se adaptaria.
Primeiro, parece-me equivocada essa questão estatutária. Uma ONG com a
missão de distribuir brinquedos não pode comprar da China porque sua
missão não é estimular a economia chinesa? Decerto que pode.
O conteúdo da Wikipédia é um bem público e ações para aprimorá-lo
beneficiam toda a comunidade planetária em favor do movimento
esperantista. Uma ONG com a missão de promover o movimento esperantista
pode tranquilamente promover a Vikipedio enquanto cumpre sua missão.
Essa observação generaliza-se e serve como um grandes trunfos dos
mutirões em expôr a Wikipédia/Wikimedia como movimento.
Dito isso, A Wikimedia Foundation tem um processo de grants aberto para
qualquer indivíduo ou organização. A associação poderia requisitar um
grant para realizar essa ação e provavelmente conseguiria, o que cria
ainda um excelente incentivo para ela promover a Wikipédia junto aos
seus trabalhos.
Ajudei a criar o Wikinews em Esperanto. Fiz a
proposta, respondi os
questionamentos, aguardei por dez meses e o projeto foi criado. Nossa
ideia para lançamento era divulgar a estudantes de jornalismo que são
associados a instituições esperantistas. Conversei com alguns deles e
acharam ótimo. Disseram que cobririam eventos para o projeto. Só
precisariam que a Wikinews fornecesse uma carta de apresentação para que
eles pudessem obter credenciais para entrada em eventos e áreas
restritas a jornalistas. Essa carta poderia ser assinada por um chapter,
mas não por mim, lógico. A ideia ficou em stand-by.
Novamente, se há uma associação a promover o esperanto que englobe a
região, ela poderia sem questão emitir essa carta, basta haver boa
vontade que, pelo seu exemplo anterior, parece existir.
Promover o noticiamento de fatos em esperanto está claramente dentro do
seu escopo. Se ela vai fazer isso usando a infra-estrutura da Wikinews
ou da "bluehost.com" é a questão do brinquedo chinês.
Mais geralmente, poderiam emitir tal carta também qualquer associação
jornalística interessada no multilinguismo, ou qualquer associação com
interesse no evento sendo noticiado.
O bacana dos mutirões é evidenciar às instituições o valor público e a
força do movimento em torno dos wikiprojetos. Perde-se essa oportunidade
quando aborda-se as situações imediatamente do ponto de vista
instituicional.
Dito isso, evidentemente nem sempre haverá tão boa recepção. Ainda
assim, talvez a melhor estratégia até seja insistir apenas com os
lugares onde houver. Mas uma coisa de cada vez.
O Congresso Brasileiro de Esperanto 2012 ocorrerá em
janeiro (daqui a
uns 10 meses), e há estandes à venda para fins comerciais e uns poucos
serão disponibilizados gratuitamente, mediante contrato a ser firmado
entre a organização que promove o evento e a organização responsável
pelo estande sob determinadas condições que, acho, atendemos. Ser
responsável significa um monte de coisa, como responder judicialmente
por mau uso, por exemplo. É uma concorrência, tipo uma licitação, mas
não se baseia em tomada de preços, e sim em atendimento de algumas
condições. E isso não pode ser feito com pessoas físicas. Um chapter
poderia concorrer, mas não eu, logicamente. Ainda em stand-by. Há a
possibilidade de participar em estandes dos outros, mas é péssimo não
poder se planejar com relação ao uso do espaço, horários, qtde de
pessoas, estratégias, recursos, custos, etc.
Esse é um caso interessante, e concordo que seria valioso ter um espaço
exclusivo para a Wikimedia, até pelos mutirões. Para pensar nisso, vou
também desconsiderar que a WMF pretende abrir um escritório aqui, que
facilitaria a resolução.
Algumas possíveis soluções:
1) A WMF, se ela própria atender as condições, firmaria diretamente o
contrato.
2) A WMF, através de um grant, paga direto à organização do congresso
por um dos espaços comerciais e destaca voluntários para organizá-lo.
(Eu cheguei a levantar proposta semelhante em conversa com o organizador
das grants da WMF, no caso para o Fórum Social Mundial, e ele ficou
muito entusiasmado com a ideia, acho que eles pagariam até a passagem do
grupo, mas infelizmente eu não pude seguir)
3) Uma associação ligada à produção de conhecimento livre poderia
concorrer com uma concessão momentânea de uso das marcas da Wikimedia.
Há outras possibilidades, mas uma coisa de cada vez.
Tem uma série de eventos ocorrendo e há um bom
material produzido para
divulgação neles. Conheço várias pessoas que contribuem, vez ou outra,
para a produção, impressão e distribuição de material de interesse, como
cartilhas para o último Congresso Brasileiro dos Estudantes de Letras.
Temos os recursos de impressão de material da wiki, via PediaPress, que
sai a preços razoáveis, especialmente se comprados em quantidade. Mas
isso envolveria captar durante um tempo (um mês?), adquirir depois e
guardar um estoque em algum lugar, até ir distribuindo nos eventos. Não
me sinto nem um pouco confortável em pedir depósito na minha conta,
qualquer que seja o projeto. Se for uma ONG, novamente isso acaba
bagunçando a prestação de contas deles. Se fosse um chapter, estaria
dentro do escopo. Estou tentando fazer isso por meio de uma livraria
privada de um de nós. Mas é um incômodo enorme, pedir favor e ainda
expor alguém à confiança/desconfiança públicas. A ver qual a melhor
forma de tratar. Em stand-by.
Entendo como os dois primeiros casos e também facilitado pela eventual
abertura de um escritório.
Tem mais, envolvendo Wiktionary, Wikiquote,
Wikisource, Wikibooks e
Commons, mas vou ficar por aqui. No fim do ano passado, fiz um plano de
ação que incluía todos os projetos em Esperanto. As ações têm sido mais
bem recebidas do que o imaginado, vários bons resultados vieram, mas
sempre esbarro nessa questão da informalidade (se não gostou de "falta
de representatividade", estou buscando outro termo). Enfim, sinto falta
da possibiliade de captar recursos de maneira transparente e ética para
realizar projetos com caráter institucional. Um outra opção, como já
citei, seria por meio de instituições parceiras. A discussão tem
avançado, e se a organização que reúne todas as associações
esperantistas do Brasil pudesse atuar em caráter institucional
(legalmente, por meio de acordo com a WMF) eu poderia, como sócio, pedir
uma alteração de Estatuto que permitisse essa questão financeira. Teria
de conversar com as pessoas, convocar assembleia e passar na votação.
Vai dar trabalho, mas criar um chapter também vai dar, então...
Interessante, pelo que entendi você tem discutido isso diretamente e há
algum entendimento de que é necessário um tipo de alteração de estatuto
dessas ONGs.
Penso que talvez seja benéfico um entendimento melhor das questões, mais
do que alteração de estatuto e fortuitamente em substituição a isso. E
noto que se houvesse uma solução institucional simples para cuidar de
todos os assuntos esses desentendimentos permaneceriam desatendidos.
Enfim, a resposta pra pergunta original é que eu prefiro lentamente
construir uma rede de instituições que se reconhecem como parte do
movimento wikimedia a criar uma interface monolítica que, apesar de
benefícios imediatos, isolará elas do movimento.
Não acho que seja ideológico no sentido que você põe na outra mensagem,
acho que é extremamente pragmático, mas é um pragmatismo de médio e
longo prazo.
Ter uma ONG exclusiva cortando esses caminhos vai ao meu ver reforçar
que outras instituições não se enxergarguem no movimento e assumam um
papel integrado, mas o verão como algo externo e relativo a outra
instituição com a qual existem apenas acordos bilaterais, não
participação intrínsica.
Dado o tamanho, a diversidade e a desigualdade presentes no Brasil, esse
capítulo ficará sobrecarregado, desorganizado, será equivocadamente
tratado como representante de algo que não é e privilegiará uma
trajetória histórica com a qual terá enorme dificuldade de romper,
falhando em atender àqueles três desafios - tamanho, diversidade,
desigualdade.
Eu nunca disse que os capítulos são "o mal", mas dá pra ver das
necessidades que surgem que esse modelo de capítulo exlcusivo nacional é
furado para o Brasil.
Imagine se algum dia o wikinews em esperanto bombar junto a todas as
associações esperantistas e precisarmos emitir uma dezena de cartas para
coberturas de eventos por dia. O capítulo precisará de um carimbador
maluco só para esse único detalhe! E com isso acabará criando
privilégios. Enquanto se isso pudesse ser distribuído por aquelas mesmas
associações regionais, voilà.
Mas insistindo nos capítulos, pelos benefícios no curto prazo,
concluiria-se que diminuir a extensão das regiões ajudaria. Capítulos
estaduais por exemplo, parecem ir bem nos EUA.
Contudo isso ignora a questão da desigualdade e diversidade. Mesmo nos
EUA, os capítulos estão surgindo e fortalecendo-se primeiro nos estados
mais ricos e ilustrados. Isso cria uma outra maluquice, pois esses são
justamente os lugares onde eles são mais supérfulos. Uma solução mais
flexível é necessária.
Ao meu ver, cada vez mais o coração do problema é essa história de
exclusividade. Eu não vejo razão para que haja uma "wikimedia brasil"
formal.
Poderia haver uma série de ONGs, possivelmente começando com uma
genérica, mas abrindo espaço para outras que delimitem-se como quiserem,
ou mesmo igualmente genéricas.
À moda das universidades francesas, a primeira delas poderia chamar-se
"Wikimedia Brasil II". As subsequentes, caso venham a surgir, assumiriam
os números consecuitivos ou o nome que quisessem.
Assim, a "Wikimedia Brasil", sem número e portanto primeira, seria o
próprio movimento wikimedia no Brasil, a totalidade dos voluntários dos
wikiprojetos agindo independentemente de qualquer instituição. No caso
de ações off-line isso corresponderia aos mutirões.
Com isso evitamos os seguintes problemas dos capítulos exclusivos:
1. sugerir externamente uma identificação falsa entre o movimento e uma
instituição única
2. o risco de não alcançar escala tanto administrativa como em suas ações
3. apresentar de cara uma imagem institucionalizada ao invés de
instituições como ferramentas de um movimento
Bem, eu vinha dizendo "uma coisa de cada vez", porque estava escrevendo
essa mensagem com esse final em mente. Espero ter sido ao menos um pouco
claro e perdôe-me a longuíssima verborragia.
Se pareci antagônico demais em algum ponto, é o cansaço. Eu acho tudo
fantástico o que todo mundo aqui faz, em particular você Michel, e por
isso mesmo me preocupa pensar adiante e provocativamente a respeito.
Abraços,
ale
Abração
Castelo