Ni!
Oi Joaquim,
Puxa pergunta muito boa.
Curiosamente, ontem eu e o Tom participamos de um seminário sobre
"direitos autorais e educação" aqui em São Paulo[1], que abordou este
tema.
Um dos palestrantes era do Paraná, onde o governo tem um projeto
chamado "Folhas", que coleta textos escritos por professores do ensino
público que complementem ou aprofundem temas das diversas áreas.
Os textos vão para um website onde estão disponíveis e posteriormente,
através de revisão por professores universitários, organizou-se uma
coletânea dos melhores textos.
Estes foram impressos como livros e distribuídos para toda a rede de
ensino, alunos e professores.
As Folhas, assim como seus livros, vem com permissão para reproduzir
partes ou o todo, mas não ficou claro se era possível remixá-las.
Uma coisa importante: os professores recebem incentivos de carreira ao
escrever Folhas, maiores se suas Folhas entram pros livros.
Esse projeto deu certo, mas o próprio palestrante fez várias ressalvas
sobre não estar concorrendo com o mercado de livros didáticos, que essa
não era a intenção do estado, etc.
Outro palestrante, era membro do conselho do Programa Nacional Livro
Didático, que valida os livros que os professores poderem escolher usar
nas suas escolas.
Os livros, já validados, escolhidos pelos professores são então
negociados pelo goveno com as editoras e entregues aos professores e
alunos.
Ele disse-nos que nada impediria uma editora ou ong apresentar um livro
produzido na Wikilivros para ser aprovado neste processo.
Uma vez aprovado, os professores poderiam pedir para usá-lo e o governo
tartaria de comprar e distribuir.
Pelo que entendi isso é um programa federal.
Bem, mas enfim, respondendo sua pergunta, acho que as chances de um
livro didático de qualidade ser produzido no Wikilivros por professores
do estado, com apoio do estado, são boas. Sem apoio, são pequenas.
Mas teria de existir responsáveis competentes, muito bem incentivados,
para tomar conta de cada livro, nos seus diversos níveis (por exemplo:
geral, pra cada tema, pra cada capítulo...). Assim como para cada ramo
paralelo de desenvolvimento que aparecer.
A escolha desses responsáveis deve surgir espontâneamente da comunidade
que for criando os primeiros textos, podendo evoluir com o tempo.
Contudo, como disse categoricamente uma professora no seminário, a
maioria dos professores da rede não tem tempo, não tem condições de
trabalho, e dependem fundamentalmente do livro didático para se
orientar.
Assim é pouco provável que muitos deles participem e se envolvam no
nível necessário se não houver bônus na carreira e/ou carga horária por
essa atividade.
Alternativamente, pode ser que, se houvesse uma facilidade de
comunicação entre eles e uma divulgação adequada do valor inestimável de
um livro didático livre produzido pela comunidade de professores, eles
se mobilizassem.
Contudo, apesar de parecer bonito, nem sei se esta segunda alternativa
seria realmente desejável, afinal eles são pagos para esse fim. Logo,
poder usar o tempo de trabalho e ser reconhecido por isso é justo.
Em ambos os casos, o envolvimento do governo, seja incentivando ou
divulgando, é praticamente requisito.
Bom, talvez a divulgação pudesse ser feita através do sindicato, ou de
anúncios em revistas dirigidas à categoria. Mas vindo do próprio estado
certamente teria mais influência.
Claro, existe sempre a possibilidade de algum professor voluntário
entusiasmado topar e escrever boa parte de um livro didático no
wikilivros sozinho, a ponto que a utilidade do material por si só já
incentivasse e mobilizasse outros menos entusiasmados a contribuir.
Como eu não sou professor da rede, não posso ajudar com isso, então a
mim, extendendo a nós, só vejo o caminho de buscar que o estado apóie
esta idéia, e continuar divulgando-a e também torcendo pra que apareça
um voluntário desses.
Uma última possibilidade... seria identificar um potencial entusiasmado
de reconhecida competência e pagar-lhe para que torne-se um voluntário
atuante.
Para isso precisaríamos identificar um tal indivíduo e um bemfeitor que
o financiasse ao menos por um período inicial.
Acho que já escrevi demais : )P
Esse seminário foi bem interessante, parece que material audiovisual
estará disponível online, mas ainda não achei.
[1]
Abs,
ale
~~
On Wed, 2009-03-25 at 01:35 -0700, Joaquim Mariano da Costa Neto wrote:
Ale,
Acho que entendi as suas colocações e, por isso, tenho algumas
dúvidas.
Passei os olhos no Common Wisdom e pretendo lê-lo por completo e com
cuidado em breve.
Você disse basicamente que a proposta de produzir colaborativamente
livros didáticos não é infactível, mas é bastante difícil, trabalhosa
e complexa, além de estar sujeita a uma evolução muito lenta e até
mesmo ao insucesso.
Considere a seguinte hipótese: uma plataforma wiki para produção
colaborativa dos livros didáticos de matemática dos ensinos
fundamental e médio, com acesso e edição facultados a todos
professores do ensino público estadual (professores de matemática e
das demais disciplinas) e a alguns professores das universidades
estaduais. Qual a probabilidade de sucesso? Após quanto tempo essa
chance de sucesso é alcançada?
Imagino que, por impossibilidade de se calcular isso, a resposta
talvez se limite a um palpite. De qualquer forma, um palpite de alguém
que entende do assunto é muito melhor do que nada. Por isso, não se
acanhe em palpitar números. ;-) 30% de chance de sucesso? 60%? 78,5%?
Quem mais quiser palpitar é bem-vindo.
Abraços,
Joaquim
______________________________________________________________________
De: Alexandre Hannud Abdo <abdo(a)usp.br>
Para: Mailing list do Capítulo brasileiro da Wikimedia.
<wikimediabr-l(a)lists.wikimedia.org>
Enviadas: Sábado, 21 de Março de 2009 4:45:23
Assunto: Re: [Wikimedia Brasil] Res: Livros didáticos
Ni!
Oi Rodrigo,
A proposta inicial era auxiliar produzir colaborativamente os livros
didáticos utilizados no estado, uma vez que serão impressos e
distribuídos aos alunos e professores pela secretaria da educação.
O que você está descrevendo é muito bonito para professores
informatizados, com pleno domínio do assunto que lecionam, com muitas
horas livres para prepararem seus cursos.
Apenas tudo o que os professores da rede pública estadual não tem.
Agora voltando à realidade, um livro didático é uma obra coerente,
onde
cada parte deve interagir com as demais de forma equilibrada para
refletir a proposta pedagógica que o embasa e orientar o professor
tendo
em vista o trabalho continuado em sala de aula.
Não existe um módulo independente em um bom livro didático, cada
assunto é tratado à luz dos assuntos anteriores e a linguagem e a
complexidade das idéias crescem junto com o aprendizado, numa
proporção
geralmente informada pela experiência do autor em sala de aula.
A estrutura hierárquica que eu descrevera busca que este fim seja
obtido canalizando o máximo de colaborações sem perder essa coerência
global.
Não disse que era a única forma, mas a princípio, ao apenas
abandonar-se qualquer hierarquia, passa a ser necessário escolher
entre
contribuições ou coerência.
Nem disse que isso não poderia seria feito numa wiki. Mas um bom livro
didático pode ser produzido até num caderno, e correções de erros
feitas
por carta, basta ser uma obra individual ou de um grupo coeso. O
desafio
é fazê-lo de forma mais participativa, senão a wiki estará ali para
posteridade.
Abs,
ale
~~
On Sat, 2009-03-21 at 01:31 -0300, Rodrigo Tetsuo Argenton wrote:
Bah! Que hierarquia o que guri, façamos um livro
no Wikibooks, que
siga uma orientação pedagógica e quem não gostar, abra outro
capítulo
com a outra vertente e a escola que escolha o que
quer utilizar, é
tri-legal essa abertura, a escola ganhará mais de uma visão e mais
de
um modo de trabalhar, poderíamos conversar com
educadores, ou com os
professores de pedagogia da USP, por exemplo, para ver qual o melhor
caminho para adotar, o que é melhor para a gurizada, mas deixar
claro
que qualquer outra vertente pode ser tomada.
Haverá pontos que não tem o que fugir, matemática vai ter que seguir
com as operações básicas e avançar, mas tem que ser um livro
descente
que permita o usuário ir a uma olimpíada de mat e
ganhar :D
Poderíamos até fazer a melhor apresentação do mundo, mas ainda
haverá
indagações de quem somos... Acho melhor
definirmos nos próximos dias
quem somos, conversar com pessoas das áreas de educação, aumentar o
conhecimento na área, estudar o que podemos fazer e quando definido
quem somos e ter uma base de argumentação forte, apresentar. Pois
pode
ser que tenhamos apenas um tiro para dar, então é
melhor nos
emponderarmos e utilizar uma .50, do que tentar acertar com uma bala
de chumbinho.
--
Rodrigo Tetsuo Argenton
rodrigo.argenton(a)gmail.com
+55 11 7971-8884
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De: Alexandre Hannud Abdo <abdo(a)usp.br>
Para: Mailing list do Capítulo brasileiro da Wikimedia.
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Enviadas: Sábado, 21 de Março de 2009 1:03:30
Assunto: Re: [Wikimedia Brasil] Res: Livros didáticos
Ni!
Concordo com o Pietro, o desenvolvimento do ParaEntender é
incompatível
com o de um bom livro didático.
Existem bons argumentos questionando a eficiência de produzir-se
livros
didáticos colaborativamente. A dificuldade de modularizar os assuntos
é
a principal delas.
O ParaEntender apenas contorna essas dificuldades, pois os textos não
foram produzidos como um conjunto nem dialogam entre si. A maioria
deles
sequer cita o assunto dos demais.
Meu convite para participar no livro deu-se justamente em consequência
do juliano vir questionar-me sobre esse assunto.
Uma coisa que recomendei a ele, e recomendo novamente aqui, é dar uma
olhada no seguinte texto que, apesar de denso, vale a leitura
http://www.benkler.org/Common_Wisdom.pdf
A parte final, "Higher Order Materials: Textbooks and Immersive Play
Environments", trata o caso de produção colaborativa de livros,
comentando inclusive as dificuldades do wikibooks (na pág. 17).
Isso não quer dizer que a proposta seja infactível, apenas que não
terá
o crescimento exponencial espontâneo que projetos como a Wikipédia
tem.
Ainda assim há experiências positivas de colaboração em livros mais
complexos, onde os módulos são menos bem definidos e dialogam entre
si.
Um exemplo são os romances de ficção escritos por fãs de certas
narrativas no japão (pra variar mil anos à frente do resto do mundo)
e,
mais recentemente, por fâs de séries de livros para jovens como
"Twilight".
Contudo, tanto quanto vejo, o método mais utilizado ali é o da
serialização e bifurcação: você evolui a narrativa sem alterar os
fatos
dados, ou cria uma nova linha ficcional listando os eventos aos quais
ela adere. Também não há preocupação em manter o mesmo estilo ou a uma
coerência forte do texto.
Não vejo como isso se encaixaria na proposta de textos didáticos.
E enfim, há o Connexions, que o Tom mencionou. Ele tem uma proposta
explícita de colaboração não-linear, contudo mesmo ali parece-me que a
reutilização e remixagem não é tão frequente, nem são tantos os
colaboradores sobre cada recurso.
Em suma, módulos trabalhosos e com vínculos fortes entre eles são
características de livros didáticos que dificultam sua produção social
paritária em larga escala.
Um possível modelo eficiente de produção wiki desses recursos
contemplaria atores com fortes estímulos ao envolvimento e
comprometimento com tais projetos, ocupando lugar numa hierarquia
meritocrática espontânea, responsável por evoluir os módulos e
integrar
as contribuições vindas da base.
Quem conhece deve ter notado, isso é apenas uma abstração da
organização de projetos complexos de software livre.
Abs,
ale
~~
On Fri, 2009-03-20 at 08:11 -0700, Pietro Roveri wrote:
Vocês consideram esse trabalho um livro? Na minha
opinião é um guia.
Não falo pelo número de páginas, mas pela forma com que o conteúdo é
apresentado. Isso não é nenhuma crítica e não tira o mérito do
trabalho, porém, se vamos discutir sobre livros, que seja o modelo
adequado.
Talvez o Ale, que é autor, possa contribuir comentando minha
opinião.
Abraços,
Pietro
______________________________________________________________________
De: Everton Zanella Alvarenga
<everton137(a)gmail.com>
Para: Mailing list do Capítulo brasileiro da Wikimedia.
<wikimediabr-l(a)lists.wikimedia.org>
Enviadas: Sexta-feira, 20 de Março de 2009 11:42:48
Assunto: Re: [Wikimedia Brasil] Livros didáticos
Sobre a produção de um livro, vejam o que Juliano Spyer diz sobre a
produção do livro lançado esses dias, 'Para entender a Internet'
<http://stoa.usp.br/oerworkshop/files/1333/7925/Para+entender+a
+Internet.pdf>,
que o Ale (o único que removeu a restrição Non Comercial!) divulgou
aqui esses dias:
* Receita para fazer livro
<http://www.naozero.com.br/making-off-para-entender>
2009/3/20 Thomas de Souza Buckup <thomasdesouzabuckup(a)gmail.com>om>:
Uma alternativa seria conversarmos diretamente
com alguém da
secretaria de educação em sp para chegarmos a um modelo de mutirão
que
> contasse com voluntários dos projetos da wikimedia e os
professores
em
sp.
Acho uma boa falar com a secretária Maria Helena Guimarães de
Castro.
Off-topic:
Vejam uma entrevista dela:
http://arquivoetc.blogspot.com/2008/02/veja-entrevista-maria-helena-guimare…
Veja – Qual seria o melhor caminho para elevar o nível dos
professores?
Maria Helena – Num mundo ideal, eu fecharia todas as faculdades de
pedagogia do país, até mesmo as mais conceituadas, como a da USP e a
da Unicamp, e recomeçaria tudo do zero. Isso porque se consagrou no
Brasil um tipo de curso de pedagogia voltado para assuntos
exclusivamente teóricos, sem nenhuma conexão com as escolas públicas
e
suas reais demandas. Esse é um modelo equivocado.
No dia-a-dia, os
alunos de pedagogia se perdem em longas discussões sobre as grandes
questões do universo e os maiores pensadores da humanidade, mas
ignoram o básico sobre didática. As faculdades de educação estão
muito
preocupadas com um discurso ideológico sobre as
múltiplas funções
transformadoras do ensino. Elas deixam em segundo plano evidências
científicas sobre as práticas pedagógicas que de fato funcionam no
Brasil e no mundo. Com isso, também prestam o desserviço de divulgar
e
perpetuar antigos mitos. Ao retirar o foco das
questões centrais,
esses mitos só atrapalham.
--
http://stoa.usp.br/tom
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